quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Pão Doce

Estava cansada de programas descolados, não queria mais ir à praia, o bar já era sem graça e não agüentava mais a cara do cinema. Resolvi regredir, fui ao parque. Caminhei, caminhei e caminhei, não estava me divertindo, nem ao menos me distraindo, estava entediada. Senti em um dos banquinhos do parque, ao lado de um senhor, bem ancião, com cara de querer conversa, tenho pavor de velho, e não tava a fim de conversar, já ia me levantar se possível correr dali, mas não ele tinha que falar algo que me intrigou.

Disse sem mais nem menos, com um sorriso nos olhos “eu sei qualquer história do mundo!” Ah arrogância, em um velho, não fica nem charmoso, fica bem irritante. Sentei-me de novo e olhei pra ele com a melhor cara desafiadora que conseguia fazer, acredito que não foi muito boa, o sorriso permanecia no olhar, nem perguntei nada e ele continuou a se gabar, disse nem meias palavras – Sou especialista no Rio de Janeiro, você sabe por que da Lapa se chamar Lapa? – fiquei muda, realmente não sabia então ele continuou. Na época da colonização portuguesa a Lapa era o lugar onde as crianças brincavam o dia inteiro, porém quando chegavam em casa, seus pais sempre perguntava onde estavam, como boas crianças que eram não sabiam o nome do lugar e apenas diziam “Ah Lá pai!” apontando pra futura Lapa. O tempo foi passando e os colonizadores interessados na região necessitavam nomeá-la para conseguir arrendá-la. Precisavam de um nome, mas qual? O vilarejo local já havia se encarregado disso, pois depois de sucessivas respostas infantis diárias “Ah lá pai” que depois virou “lá pai” e evoluiu pra “Lapa”, nosso boêmio bairro atual.

Estava chocada com a riqueza de detalhes que ele deu sobre a história, sem querer deixei escapar uma perguntinha, realmente queria saber o porquê do Pão de Açúcar ser chamado assim. Vi que o velhinho ficou se achando quando viu que eu fiquei interessada, que saco, fiz a melhor cara blasé que consegui. Então ele começou a explicação, endireitou-se no banco e disse que a história era até bonita e simples, que na época do descobrimento tudo o que se buscava eram as especiarias, incluindo o açúcar. O sonho dos tripulantes das caravelas era sentir um gostinho doce na boca, e a utopia seria um pão feito de açúcar. Cabral ao chegar à Bahia enviou uma caravela ao litoral sul no intuito de fazer uma expedição reconhecedora, porém os tripulantes revoltados não queriam, queriam apenas as especiarias e Cabral O mentiroso disse “Se querem especiarias é ao sul que encontrarão, pra que fica as Índias, aqui só tem pau-brasil e índio pelado”. Então os iludidos partiram em direção ao Sul, porém quando chegaram ao Rio, estavam muito doentes, a vida em alto-mar não é algo muito fácil minha querida e um dos tripulantes começou a delirar apontando para o Pão de Açúcar “Olhem! È um pão!” e dos se viraram acreditando ver a mesma coisa, então ele continuou “É um pão branco!Deve ser feito de açúcar!” e todo realmente viam a mesma coisa. Atracaram na atual Praia Vermelha e foram até o Pão de Açúcar provando o seu sabor, sentiram algo doce e se sentiram no paraíso. Escreveram cartas ao governo e às suas amantes, estavam nas Índias ao lado de um pão de açúcar gigante, pra eles realmente foi, a doença os matara ali mesmo na beira do seu querido pão. Que em homenagem foi nomeado assim. Foi descoberto depois que a visão deturpada assim como o paladar eram sintomas da doença do grupo.

Estava emocionada com a história e rendida à sabedoria do sábio velhinho. Fiquei tentada e me rendi a tentação, convidei-o para um café e quem sabe com um pão doce, que ironia, mas ele recusou com um sorriso estranho no rosto, sorriso que se faz quando se está prestes a rir muito. Ele se levantou falou pro ar algo que me soou como “otária” e se despediu, com um largo sorriso no rosto. Que estranho, otária?



Histórias não verídicas, tudo mentira inventada pelo velho genial